O caso do estudante de psicologia Bruno Borges, de 24 anos, que desapareceu semana passada em Rio Branco, no Acre, continua a intrigar a internet. Antes de partir, o jovem deixou em seu quarto 14 livros criptografados escritos à mão e uma réplica da estátua do filósofo italiano Giordano Bruno (1548-1600).
A estátua em questão, que custou R$ 7 mil, é obra do artista plástico Jorge Rivasplata. Em entrevista ao G1, o escultor disse acreditar que Bruno seja a reencarnação do filósofo, e que o rapaz tenha compleado a obra do italiano, que morreu queimado durante a Inquisição. “Dá para acreditar que foi reencarnado Giordano Bruno nele. Não posso contar mais, a única coisa que posso dizer é que já terminou os livros que ele [Giordano] deixou inconcluso”, disse.
Rivasplata afirmou que a escultura de mais de dois metros foi preenchida com espuma, madeira, cascalho e cimento para que ficasse mais pesada e não pudesse ser movida, já que isto poderia danificar os símbolos dos livros que estavam desenhados no chão do quarto.
O jovem foi aluno de Rivasplata em um curso de desenho e pintura, e a peça do filósofo foi finalizada dentro do quarto de Bruno. Após fixá-la no local, o artista plástico alegou que a última vez em que se falaram foi por mensagens no celular, quando Bruno disse que “esse trabalho o Acre vai conhecer, o Brasil e o mundo”.
Quem foi Giordano Bruno?
Nascido em 1548 em Nola, na Itália, Giordano Bruno foi um monge, filósofo, matemático, astrônomo, poeta e teólogo. Aos 17, ingressou na Ordem dos Pregadores, mas a abandonou em 1575, pouco depois de receber seu doutorado em teologia e após adotar ideias que iam contra as regras da Igreja naquela época. Para ele, a verdade deveria prevalecer sobre qualquer desejo, crença ou ideologia e, por isso, questionava abertamente a existência do céu e do inferno, a danação eterna e a virgindade de Maria ao conceber Jesus Cristo.
Um dos estudos mais famosos do italiano é o chamado “plurarismo cósmico”, na qual apontou que as estrelas não eram simplesmente pontos de luz no céu, mas pequenos “sóis” distantes, cada um com o próprio conjunto de planetas girando em torno de si. Outra noção estudada por Giordano foi a de que o universo é infinito, o que inclui a existência de planetas para além do nosso sistema solar e a possibilidade de vida inteligente nesses outros universos. O filósofo também era defensor do panteísmo, crença em que Deus não é uma figura única e separada da vida concrenta, mas sim uma força presente em tudo e todos – o conceito de que ele e o universo, no fundo, são a mesma coisa.
Todos esses levantamentos fizeram com que Giordano fosse preso e condenado em Veneza, anos depois de peregrinar por toda a Europa em busca de mais conhecimento e liberdade intelectual. O julgamento aconteceu em Roma, até ser acusado de heresia e queimado em uma fogueira no dia 17 de fevereiro de 1600.
Giordano Bruno e Bruno Borges não compartilham apenas os mesmos nomes, mas também algumas ideias – como a liberdade de expressão e busca contínua pelo conhecimento do universo. Inclusive, um dos trechos de um dos livros criptografados do acreano fala sobre “a busca da verdade absoluta”, segundo a irmã mais velha do jovem desaparecido. No entanto, o sumiço repentino do rapaz deve ter uma explicação lógica, já que a Polícia Civil continua em sigilo com as investigações.
Textos traduzidos
Desde que partes dos livros escritos por Bruno foram parar na internet, dezenas de usuários têm se mobilizado para decifrar os textos criptografados do jovem. Apenas uma página foi traduzida, uma vez que as 14 obras originais estão em posse das autoridades, mas já existe até um site dedicado para a tradução completa de outros trechos caso apareçam na web.
Leia abaixo a tradução feita pela página “Decifre o Livro”:
“Caminho difícil
Por milhares de anos o ser humano vem tentando encontrar respostas para perguntas como ‘qual o sentido da vida’? A filosofia que, ao que tudo indica, parece ter se iniciado com Tales de Mileto em meados de 700 a.C. visa encontrar vestígios de perguntas sem respostas. A pesquisa profunda pela verdade absoluta advém da filosofia, e quando falamos a respeito de caminhos fáceis ou difíceis estamos nos referindo a esse tipo de teorema.
É fácil aceitar o que desde criança te ensinaram que é errado. Difícil é, quando adulto, entender que te ensinaram errado o que desde criança você suspeitou que fosse correto. Em outras palavras, se você se enquadra em algum cujos estímulos do meio lhe determinaram certo comportamento, fazendo com que estivesse à mercê de crenças já providas e bem estabelecidas em dogmas e rituais, com uma massa concentrada de pessoas nela; ou permitindo-o ficar no conformismo, aceitando o conceito de felicidade e de sentido da vida embutido pela mídia e pela sociedade, então claramente você faz parte do caminho fácil para a busca da verdade absoluta.
Acaso se enquadre na segunda opção, ou seja, aquele que suspeitava de todo conjunto de crenças que lhe foi enraizado, então este tem tudo para ser um investigador da veracidade nas coisas ao seu redor, entrando em um caminho mais complicado, no qual uma minoria se arrisca ou enfrenta com bravura.”
Fonte: G1, com informações da Superinteressante, Hypeness, Revista Galileu, Decifre o Livro